Hora literária – veja 5 poemas de Mario Quintana
Confira cinco poemas do autor que encantam pela simplicidade e profundidade.

A poesia de Mario Quintana encanta leitores há gerações com sua sensibilidade, simplicidade e toques de humor e melancolia. Conhecido por sua escrita acessível, mas repleta de profundidade, o poeta gaúcho transformava o cotidiano em versos que dialogam diretamente com a alma. Nesta “Hora Literária”, selecionamos cinco poemas marcantes de Mario Quintana para você apreciar e se inspirar.
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Mario Quintana e seus poemas
Mario Quintana nos deixou em 5 de maio de 1994, deixando um legado poético inesquecível. Natural de Alegrete, uma cidade do interior do Rio Grande do Sul, ele nasceu em 30 de julho de 1906 e se tornou um dos maiores nomes da poesia brasileira.
Sua escrita, marcada pelo lirismo e pela simplicidade, transformava o cotidiano em versos profundos e cativantes. Ao longo da vida, publicou mais de vinte livros, sendo “A Rua dos Cataventos” sua estreia no mundo literário, já aos 34 anos. Além de sua vasta produção para o público adulto, Mario também dedicou parte de sua obra à literatura infantojuvenil, demonstrando sensibilidade e carinho pelas pequenas maravilhas da vida.
Para celebrar sua poesia, selecionamos cinco poemas marcantes do autor. Confira a seguir!
A Rua dos Cataventos
Da vez primeira em que me assassinaram,
Perdi um jeito de sorrir que eu tinha.
Depois, a cada vez que me mataram,
Foram levando qualquer coisa minha.Hoje, dos meu cadáveres eu sou
O mais desnudo, o que não tem mais nada.
Arde um toco de Vela amarelada,
Como único bem que me ficou.Vinde! Corvos, chacais, ladrões de estrada!
Pois dessa mão avaramente adunca
Não haverão de arrancar a luz sagrada!Aves da noite! Asas do horror! Voejai!
Que a luz trêmula e triste como um ai,
A luz de um morto não se apaga nunca!Canção do dia de sempre
Tão bom viver dia a dia…
A vida assim, jamais cansa…Viver tão só de momentos
Como estas nuvens no céu…E só ganhar, toda a vida,
Inexperiência… esperança…E a rosa louca dos ventos
Presa à copa do chapéu.Nunca dês um nome a um rio:
Sempre é outro rio a passar.Nada jamais continua,
Tudo vai recomeçar!E sem nenhuma lembrança
Das outras vezes perdidas,
Atiro a rosa do sonho
Nas tuas mãos distraídas…Eu escrevi um poema triste
Eu escrevi um poema triste
E belo, apenas da sua tristeza.
Não vem de ti essa tristeza
Mas das mudanças do Tempo,
Que ora nos traz esperanças
Ora nos dá incerteza…
Nem importa, ao velho Tempo,
Que sejas fiel ou infiel…
Eu fico, junto à correnteza,
Olhando as horas tão breves…
E das cartas que me escreves
Faço barcos de papel!Esperança
Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano
Vive uma louca chamada Esperança
E ela pensa que quando todas as sirenas
Todas as buzinas
Todos os reco-recos tocarem
Atira-se
E — ó delicioso voo!
Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,
Outra vez criança…
E em torno dela indagará o povo:
— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá
(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA…Presença
É preciso que a saudade desenhe tuas linhas perfeitas,
teu perfil exato e que, apenas, levemente, o vento
das horas ponha um frêmito em teus cabelos…
É preciso que a tua ausência trescale
sutilmente, no ar, a trevo machucado,
as folhas de alecrim desde há muito guardadas
não se sabe por quem nalgum móvel antigo…
Mas é preciso, também, que seja como abrir uma janela
e respirar-te, azul e luminosa, no ar.
É preciso a saudade para eu sentir
como sinto – em mim – a presença misteriosa da vida…
Mas quando surges és tão outra e múltipla e imprevista
que nunca te pareces com o teu retrato…
E eu tenho de fechar meus olhos para ver-te.