Fagundes Varela – quem foi, suas obras e características literárias
Veja as características marcantes de sua literatura, como a melancolia e o ultrarromantismo.
Fagundes Varela, destacado poeta romântico brasileiro, nasceu na antiga vila de São João Marcos, atualmente Rio Claro, no estado do Rio de Janeiro. Filho de um juiz, durante a juventude escolheu se afastar dos padrões conservadores de sua classe social, mergulhando na boemia, na poesia e no consumo de álcool.
Falecido em 18 de fevereiro de 1875, Fagundes Varela é reconhecido como um dos grandes nomes da poesia romântica no Brasil. Embora seja mais associado à segunda geração do romantismo, sua produção literária apresenta influências tanto da primeira quanto da terceira geração. Entre suas obras mais conhecidas está o poema “Cântico do Calvário”.
Fagundes Varela
- Quem foi? (em resumo)
O poeta, que viveu entre 1841 e 1875, integrou a segunda geração do romantismo no Brasil. Sua produção literária reflete características do ultrarromantismo, como a angústia e o pessimismo. Além disso, suas obras incorporam elementos tanto da primeira quanto da terceira fases do movimento romântico. Um de seus poemas mais conhecidos, “Cântico do Calvário”, foi escrito em homenagem ao filho do autor, que faleceu aos três meses.
Principais características das obras
O poeta Fagundes Varela é um representante da segunda geração do romantismo, sendo suas obras marcadas por características como:
- Evasão: uma busca do eu lírico por escapar da realidade;
- Culto à morte: a visão do fim da vida como um alívio para o sofrimento;
- Pessimismo: uma perspectiva negativa sobre a existência;
- Individualismo: foco na introspecção e nos sentimentos do eu poético;
- Exagero sentimental: presença de emoções intensas e excessivas;
- Idealização: enaltecimento do amor e da figura feminina amada.
No entanto, algumas de suas poesias apresentam elementos que se alinham à terceira geração romântica, como:
- menor grau de idealização;
- reflexões de crítica social.
Além disso, há traços associados à primeira geração romântica:
- presença de temas bucólicos;
- manifestações de nacionalismo;
- abordagem de questões religiosas.
Obras de Varela
- Noturnas (1861);
- O estandarte auriverde (1863);
- Vozes da América (1864);
- Cantos e fantasias (1865);
- Cantos meridionais (1869);
- Cantos do ermo e da cidade (1869);
- Anchieta ou O Evangelho nas selvas (1875);
- Cantos religiosos (1878);
- Diário de Lázaro (1880).
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Análise do poema “Cântico do calvário”
O célebre poema “Cântico do Calvário”, de Fagundes Varela, possui uma dedicatória emocionante: “À memória de meu filho, morto a 11 de dezembro de 1863”. Trata-se de uma obra profundamente sentimental, escrita em homenagem ao filho falecido e publicada no livro Cantos e Fantasias em 1865.
A composição adota uma estrutura formal com versos decassílabos, caracterizados pela ausência de rimas, mas é inegavelmente marcada pelo ultrarromantismo. Temas como melancolia, pessimismo e morbidez permeiam os versos, revelando o intenso sofrimento do eu lírico.
Ao longo do poema, o eu lírico faz comparações tocantes para descrever o filho, chamando-o de “pomba predileta” da esperança, “estrela” que brilha “entre as névoas do inverno”, e ainda “messe [colheita] de um dourado estio”, entre outras metáforas. No entanto, com a morte do menino, ele sente que perdeu também sua fé e suas perspectivas.
O sofrimento é retratado de forma intensa: as “lágrimas saudosas” tornam-se o foco, e ele afirma:
“São mortos para mim da noite os fachos,
Mas Deus vos faz brilhar, lágrimas santas,
E à vossa luz caminharei nos ermos!”
Aqui, a dor ganha um papel quase sagrado, sendo valorizada como o propósito de sua existência.
O paradoxo presente no poema destaca a criança como uma “esperança amargamente doce!”, e a ausência do filho é descrita em versos como:
“Não mais te embalarei sobre os joelhos,
Nem de teus olhos no cerúleo brilho
Acharei um consolo a meus tormentos!”
A morte do filho intensifica o papel do pai como um poeta marcado pela tristeza universal:
“Tornei-me o eco das tristezas todas
Que entre os homens achei!”
O eu lírico expressa revolta pela inversão natural da ordem da morte, julgando-se mais merecedor de partir do que o menino, tão jovem e puro:
“Oh! quantas horas não gastei, sentado
Sobre as costas bravias do Oceano,
Esperando que a vida se esvaísse
Como um floco de espuma, ou como o friso
Que deixa n’água o lenho do barqueiro!”
O nascimento do filho, porém, trouxe ao eu lírico uma alegria antes desconhecida:
“Ah! quando a vez primeira em meus cabelos
Senti bater teu hálito suave;
Quando em meus braços te cerrei, ouvindo
Pulsar-te o coração divino ainda […]
Ah! pelas fibras
Senti rugir o vento incendiado
Desse amor infinito que eterniza […]”
Contudo, a felicidade mostrou-se efêmera, e o destino impôs ao eu lírico uma dolorosa punição:
“Cegou-me tanta luz! Errei, fui homem!
E de meu erro a punição cruenta
Na mesma glória que elevou-me aos astros,
Chorando aos pés da cruz, hoje padeço!”
Por fim, mesmo imerso no luto e na desesperança, o poema de Fagundes encerra com um apelo à crença em uma vida além da morte:
“Mas não! Tu dormes no infinito seio
Do Criador dos seres! Tu me falas
Na voz dos ventos, no chorar das aves […]
E são teus raios que meu estro aquecem!”