Só literatura & arte – as características do Arcadismo

É a simplicidade, equilíbrio, razão e idealização da vida no campo.

O Arcadismo, também conhecido como Neoclassicismo, marcou profundamente a literatura e a arte do século XVIII ao propor um retorno aos valores da simplicidade, equilíbrio e racionalidade. Inspirado nos ideais do Iluminismo e na estética clássica greco-romana, esse movimento artístico e literário buscou romper com os exageros do Barroco, exaltando a vida bucólica, a harmonia com a natureza e a moderação dos sentimentos.

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Hoje, nós vamos explorar as principais características do Arcadismo e compreender como seus ideais moldaram a produção cultural da época, especialmente na literatura.

Características do Arcadismo

O Arcadismo, também conhecido como Neoclassicismo, surgiu como uma resposta direta aos excessos do Barroco, movimento artístico anterior que se destacava pelo rebuscamento linguístico, pela intensidade emocional e por uma visão de mundo profundamente marcada pela religiosidade e pelo conflito interior. Em oposição a esse estilo dramático e carregado, os árcades propunham uma estética mais serena, racional e naturalista, baseada na valorização da vida simples e em harmonia com a natureza.

Para compreender de forma mais ampla as características do Arcadismo, é fundamental considerar o contexto histórico e cultural do século XVIII, especialmente em Portugal, onde o movimento teve início antes de se expandir para as colônias. Nessa época, o Iluminismo se firmava como corrente de pensamento dominante na Europa. Chamado de “Século das Luzes”, esse período foi marcado por uma valorização da razão como caminho para o conhecimento, pela busca da verdade por meio do pensamento lógico e pela crítica às estruturas sociais e políticas tradicionais.

Grandes eventos históricos reforçaram essas mudanças de pensamento, como a Revolução Francesa e a Queda da Bastilha, que simbolizaram o fim do Antigo Regime e a ascensão da burguesia ao poder. Ao mesmo tempo, a Revolução Industrial dava seus primeiros passos, promovendo transformações econômicas profundas e alterando o perfil do público leitor. Esse novo cenário exigia uma literatura mais acessível, racional e voltada para temas cotidianos e universais — valores que o Arcadismo absorveu e reproduziu.

Em meio a esse clima de mudança, o Arcadismo se consolidou com uma proposta clara: romper com os excessos emocionais e estilísticos do Barroco e abraçar a razão, a clareza e a beleza idealizada. Acreditava-se que tudo poderia ser compreendido por meio da lógica e da observação, e que a arte deveria refletir esse novo espírito.

Enquanto isso, no Brasil, o Barroco ainda predominava, especialmente nas regiões mais influentes cultural e economicamente, como Minas Gerais. Naquele momento, a mineração era o motor da economia colonial, e o território mineiro fervilhava de atividade intelectual e política. Foi nesse ambiente que nasceu a Inconfidência Mineira, movimento de cunho separatista que reunia intelectuais, poetas e outros membros da elite local. Muitos desses nomes ligados à Inconfidência também foram expoentes do Arcadismo no Brasil, como Cláudio Manuel da Costa e Tomás Antônio Gonzaga, cujas obras literárias refletiam os ideais de liberdade e razão da época.

A repressão à Inconfidência, com destaque para o enforcamento de Tiradentes e o exílio de vários envolvidos, influenciou diretamente a produção literária do período, dando ao Arcadismo brasileiro um caráter muitas vezes patriótico e comprometido com a crítica social.

Principais características do Arcadismo

Por se tratar de uma transição entre estilos tão distintos — o Barroco e o Romantismo, que viria a seguir —, o Arcadismo foi marcado por uma série de elementos próprios, que o diferenciam claramente das demais escolas literárias:

  • Valorização da razão, da moderação e da simplicidade: os textos árcades evitam exageros emocionais, optando por uma linguagem clara e equilibrada.

  • Exaltação da natureza: a vida no campo, longe da correria e dos vícios urbanos, é idealizada como o caminho para a verdadeira felicidade.

  • Imitação dos clássicos: há forte inspiração na cultura greco-romana, tanto na forma quanto nos temas abordados.

  • Desprezo pela ostentação e superficialidade: o ideal de vida simples e essencial se opõe aos valores da sociedade burguesa em ascensão.

  • Amor galante e idealizado: as figuras femininas são frequentemente retratadas de maneira etérea, como musas inspiradoras, alvo de cortejos elegantes e respeitosos.

Entre os elementos mais marcantes do estilo árcade estão também o bucolismo e o pastoralismo, que representam a idealização da vida rural e a presença constante de pastores e pastoras em cenários idílicos, cercados por campos, rios e montanhas. Essa atmosfera campestre era reforçada pelo uso de pseudônimos pastoris — os poetas assumiam nomes fictícios como pastores e camponeses, criando uma espécie de personagem lírico que dialogava com a tradição clássica.

Só literatura & arte – as características do Arcadismo (Foto: Unsplash).
Só literatura & arte – as características do Arcadismo (Foto: Unsplash).

Além disso, diversas expressões em latim tornaram-se emblemáticas nesse período, servindo como lemas que sintetizavam os valores do Arcadismo:

  • Fugere urbem: fugir da cidade, do caos urbano;

  • Locus amoenus: lugar ameno, agradável, em contato com a natureza;

  • Aurea mediocritas: valorização da justa medida e do equilíbrio;

  • Inutilia truncat: recusa ao supérfluo e ao desnecessário;

  • Carpe diem: aproveitar o dia, viver o presente de forma simples e plena.

Por fim, o Arcadismo também absorveu influências do Iluminismo, especialmente no que diz respeito à crítica social. Muitos poetas passaram a questionar a opulência e os vícios da sociedade burguesa, adotando um tom reflexivo e, por vezes, irônico em seus textos.

Formas de produção literária no Arcadismo

A literatura árcade se destacou principalmente em dois gêneros fundamentais: a poesia lírica e a poesia épica. Ambas refletiam os ideais do período, ainda que com enfoques distintos — uma voltada à subjetividade controlada e à vida simples; a outra, à exaltação racional dos feitos heroicos. A seguir, uma explicação mais detalhada de cada uma:

1. Poesia lírica

A produção lírica no Arcadismo se caracteriza pela busca da simplicidade formal e temática. Os poemas evitam o excesso de ornamentos linguísticos típicos do Barroco e optam por uma linguagem clara, serena e racional. A natureza é presença constante nos versos, muitas vezes representando um ideal de paz e equilíbrio. O amor é tratado de maneira idealizada, cortês e distante, com forte influência da mitologia clássica e do pastoralismo.

Além disso, o sujeito poético frequentemente adota um pseudônimo pastoril, assumindo uma identidade fictícia ligada ao campo, o que reforça o bucolismo tão valorizado na época.

2. Poesia épica

Já a poesia épica árcade se alinha diretamente aos valores iluministas e ao racionalismo do século XVIII. Nessa forma de produção, há uma exaltação de feitos grandiosos, normalmente ligados à formação e identidade das nações. No Brasil, o foco foi a valorização do indígena como herói nacional, em substituição à figura do europeu colonizador. Esse deslocamento tem forte carga simbólica e política, aproximando a literatura da luta por autonomia e identidade cultural.

As epopeias produzidas nesse período mantêm a estrutura clássica — com narrador objetivo, versos decassílabos e divisão em cantos —, mas agora revestidas de um novo espírito, que valoriza a razão, a ordem e o progresso.

Mycarla Oliveira, especialista em língua portuguesa, no portal Pensar Cursos, também detalha sobre “A beleza e origem das palavras aportuguesadas”, ou seja, termos que nasceram em outros idiomas, mas que, ao longo do tempo, foram abraçados pela nossa língua com novas formas, pronúncias e sentidos.

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