Realismo fantástico – tipo de narrativa que causa impacto

Ele desafia a percepção da realidade ao misturar o cotidiano com o extraordinário de forma sutil e envolvente.

O realismo fantástico é um dos gêneros literários mais impactantes e envolventes, misturando elementos do cotidiano com o extraordinário de maneira natural. Diferente da fantasia tradicional, onde a magia e o sobrenatural fazem parte de um universo próprio, o realismo fantástico insere o impossível dentro da realidade de forma sutil e inquietante.

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Esse tipo de narrativa desafia a percepção do leitor, brincando com a linha tênue entre o real e o imaginário. Seja em histórias de Gabriel García Márquez, Isabel Allende ou Murilo Rubião, o impacto do realismo fantástico está na sua capacidade de provocar reflexão, estranhamento e até mesmo uma nova visão sobre o mundo ao nosso redor.

O fenômeno do realismo fantástico

O realismo fantástico é um conceito presente em diversas manifestações artísticas, caracterizando-se pela fusão entre elementos reais, imaginários e oníricos, criando um universo coeso e intrigante. Essa abordagem narrativa combina fatos históricos, mitos, lendas e aspectos do folclore para construir uma visão alternativa da realidade, recorrendo a imagens que desafiam a lógica tradicional e a racionalidade científica.

Contexto histórico

Desde os primórdios da humanidade, as histórias fantásticas fizeram parte da tradição oral, descrevendo lugares distantes e acontecimentos muitas vezes irreais ou ambientados em um passado remoto. A literatura de fantasia tem suas raízes nesses relatos ancestrais. Já a literatura de viés realista, conforme mencionado por Jorge Luis Borges, começou a se consolidar apenas no século XIII, com as sagas escandinavas e o romance picaresco.

No entanto, foi somente no século XX que a literatura passou a buscar novas formas de representação, indo além da simples reprodução da realidade. O termo “realismo mágico” surgiu em 1925, cunhado pelo crítico de arte alemão Franz Roh, que o utilizou para descrever um tipo de arte pictórica que mesclava realismo e fantasia.

Realismo fantástico, mágico ou maravilhoso?

Embora frequentemente utilizados como sinônimos, os conceitos de realismo fantástico, realismo mágico e realismo maravilhoso possuem nuances distintas e geram debates entre os estudiosos da literatura.

O realismo maravilhoso, por exemplo, está associado à literatura latino-americana e tem suas raízes nos relatos dos colonizadores durante as Grandes Navegações, quando descreveram as terras recém-descobertas como repletas de elementos fantásticos. Essa vertente literária possui uma forte carga crítica, refletindo as contradições da América Latina, onde modernidade e estruturas arcaicas coexistem de forma paradoxal.

Por outro lado, o realismo mágico e o realismo fantástico não estão vinculados a um contexto geográfico ou histórico específico. Obras de diferentes autores, como E.T.A. Hoffmann e Edgar Allan Poe, são frequentemente classificadas dentro dessa estética, mesmo apresentando abordagens bastante distintas.

Principais características 

  • Integração entre elementos cotidianos e aspectos folclóricos, míticos ou oníricos.
  • Naturalização do extraordinário, tornando o fantástico parte inerente da realidade.
  • Estruturas narrativas que podem romper com a linearidade do tempo e a causalidade lógica.
  • Questionamento dos limites da racionalidade e da percepção do mundo.

O realismo fantástico, portanto, desafia convenções narrativas e convida o leitor a enxergar a realidade sob novas perspectivas, misturando o ordinário ao extraordinário de forma única e impactante.

Realismo fantástico – tipo de narrativa que causa impacto (Foto: Unsplash).
Realismo fantástico – tipo de narrativa que causa impacto (Foto: Unsplash).

O realismo fantástico na literatura brasileira

O realismo fantástico encontrou no Brasil alguns de seus maiores expoentes, trazendo elementos inusitados e surreais para narrativas profundamente enraizadas na cultura nacional. Um dos pioneiros do gênero no país foi Murilo Rubião, nascido em 1º de junho de 1916, na atual Carmo de Minas (MG), e falecido em setembro de 1991.

Embora tenha tido uma vida longa, sua produção literária foi concisa e marcada por um extremo rigor estilístico. Seus 33 contos foram escritos e revisados inúmeras vezes, revelando um perfeccionismo singular. Em suas histórias, o insólito surge naturalmente no cotidiano, dando espaço para dragões, coelhos falantes e outros elementos extraordinários, muitas vezes contrastando com referências bíblicas e cenários comuns.

Outro grande nome do realismo fantástico brasileiro é José J. Veiga, nascido em Corumbá de Goiás (GO), em 2 de fevereiro de 1915. Autor de contos, novelas e romances, Veiga transitava entre o maravilhoso, o absurdo e o alegórico, dissolvendo as barreiras entre essas classificações. Suas narrativas frequentemente se passavam em pequenas cidades do interior, onde o inesperado invadia a rotina, trazendo consigo criaturas e eventos inexplicáveis que desestabilizavam a ordem social e psicológica dos personagens.

Já no campo do teatro e da televisão, a obra Saramandaia, de Dias Gomes (1922–1999), tornou-se uma das expressões mais marcantes do realismo fantástico no Brasil. Lançada como telenovela em 1976, a trama se passa na fictícia cidade de Bole-Bole, onde disputas políticas entre conservadores e progressistas refletem alegoricamente o Brasil da época, governado pela Ditadura Militar.

Contudo, o que torna a história verdadeiramente singular são os personagens extraordinários e suas características inusitadas: João Gibão esconde um par de asas e pode manipular o tempo; Dona Redonda literalmente explode de tanto comer; o coronel Zico Rosado solta formigas pelo nariz; Aristóbulo se transforma em lobisomem; e Seu Cazuza tem um coração que, quando está nervoso, salta para fora da boca.

Por meio desses e de outros escritores, o realismo fantástico se consolidou no Brasil como um dos gêneros mais impactantes, desafiando a lógica e transportando o leitor para universos onde o extraordinário se mistura ao ordinário de maneira única.

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