A carta argumentativa tem diferença? Veja estrutura e como fazer
Aprenda também a estrutura ideal e dicas práticas para escrever uma carta argumentativa eficaz.
A carta argumentativa é um gênero textual que combina duas estruturas essenciais, indicadas já em sua denominação: a configuração de uma carta (ou epístola) e a abordagem própria da tipologia argumentativa. De maneira geral, esse formato tem como principal objetivo expor e sustentar um ponto de vista, apresentando argumentos elaborados pelo remetente com a intenção de convencer ou influenciar o destinatário.
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Essa característica híbrida torna o gênero uma ferramenta eficaz para a comunicação de ideias de forma pessoal e persuasiva.
Como seria uma carta argumentativa?
Principais características
Além da estrutura básica comum a todas as cartas, mencionada anteriormente, é fundamental observar as particularidades do gênero argumentativo.
Primeiramente, é importante destacar que, na introdução (composta pelo(s) primeiro(s) parágrafo(s), dependendo da extensão da carta), deve-se apresentar de forma clara o tema em discussão e a tese, ou seja, a posição que será defendida ao longo do texto. Nos parágrafos seguintes, é necessário sustentar a tese com argumentos sólidos, fornecendo fatos, informações e análises que comprovem a veracidade da opinião defendida pelo remetente.
No último parágrafo do corpo da carta, é relevante reforçar as posições adotadas ao longo do texto e concluir reafirmando o ponto de vista, agora respaldado pelos argumentos apresentados.
Além dessas diretrizes da argumentação, é essencial lembrar que a linguagem de uma carta argumentativa deve seguir a norma padrão da língua portuguesa. Muitas vezes, é comum observar na epístola o uso da interlocução, ou seja, um diálogo direto com o leitor, expresso por verbos conjugados na segunda pessoa do discurso ou por expressões como “o leitor deve perceber que…” ou “a leitora deve refletir sobre…”.
Exemplo
Abaixo, está a carta deixada pelo ex-presidente do Brasil, Getúlio Vargas, redigida pouco antes de seu suicídio. Nela, o então Chefe do Executivo expressa sua convicção de que estava sendo alvo de perseguição por se empenhar em defender “o povo, especialmente os mais humildes”.
24 de agosto de 1954
Brasileiros,
Mais uma vez, as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se e desencadeiam-se sobre mim. Não me acusam, insultam; não me combatem, caluniam; e não me dão o direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender, como sempre defendi, o povo e principalmente os humildes.
Sigo o destino que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci.
Iniciei o trabalho de libertação e instaurei o regime de liberdade social. Tive de renunciar. Voltei ao governo nos braços do povo.
A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho. A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a Justiça da revisão do salário mínimo desencadearam-se os ódios.
Quis criar a liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Petrobras, mal começa esta a funcionar, a onda de agitação avoluma-se. A Eletrobrás foi obstaculada até o desespero. Não querem que o trabalhador seja livre, não querem que o povo seja independente.
Assumi o governo dentro da espiral inflacionária que destruía os valores do trabalho. Os lucros das empresas estrangeiras alcançavam até 500% ao ano. Nas declarações de valores do que importávamos existiam fraudes constatadas de mais de 100 milhões de dólares por ano. Veio a crise do café, valorizou-se nosso principal produto. Tentamos defender seu preço e a resposta foi uma violenta pressão sobre a nossa economia, a ponto de sermos obrigados a ceder.
Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a uma pressão constante, incessante, tudo suportando em silêncio, tudo esquecendo e renunciando a mim mesmo, para defender o povo que agora se queda desamparado. Nada mais vos posso dar a não ser o meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha vida.
Escolho este meio de estar sempre convosco. Quando vos humilharem, sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa porta, sentireis em vosso peito a energia para a luta por vós e vossos filhos.
Quando vos vilipendiarem, sentireis no meu pensamento a força para a reação.
Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota de meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao ódio respondo com perdão. E aos que pensam que me derrotam respondo com a minha vitória. Era escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo, de quem fui escravo, não mais será escravo de ninguém.
Meu sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu sangue terá o preço do seu resgate.
Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na história.
Getúlio Vargas